domingo, 21 de junho de 2009

LEITE




O LEITE

Desde o princípio da civilização humana, o leite tem sido considerado um alimento básico para crianças e um complemente indispensável na dieta dos adultos. Os nutricionistas referem-se a ele como sendo o alimento natural mais completo de fácil digestão. O leite é o primeiro e, praticamente, o único alimento dos recém-nascidos de todas as espécies de animais mamíferos, sendo juntamente com o mel, as únicas substâncias produzidas pela natureza com a única e exclusiva finalidade de servirem como alimento.
De uma forma bem simplificada, pode-se dizer que o leite é o líquido branco opaco, resultante da ordenha de fêmeas das espécies mamíferas no período de lactação. São poucas as espécies mamíferas de interesse comercial, sendo que a espécie bovina é, praticamente a única de expressão.
No seu estado natural, o leite é um líquido e sob esta forma é, normalmente utilizado como alimento. Todavia, por se tratar de um alimento muito rico em princípios nutritivos e em estado facilmente assimilável, a sua conservação sem intervenção tecnológica é praticamente impossível, sendo portanto, uma substância altamente perecível. Ao ser armazenado em condições ambientais, o leite sofre uma série de alterações devido, basicamente à ação dos microrganismos contaminantes. Tais alterações e / ou transformações levaram ao descobrimento de vários derivados do leite, que passaram a ser utilizados como alimento. foram assim desenvolvidas as diversas formas de preservar e, consequentemente, aproveitar o excesso de leite não consumido dentro de algumas horas após a ordenha. Dessa forma, a coalhada, o iogurte e o queijo são os principais produtos que surgiram empiricamente, muito antes que a tecnologia fosse conhecida e, que se constituíram em variedades alimentícias de excelente valor nutritivo, amplamente consumidas até hoje.


COMPOSIÇÃO DO LEITE

Na sua complexidade, o leite apresenta os seus principais componentes distribuídos num meio aquoso, formando ao mesmo tempo, uma solução verdadeira, representada pelos sais e lactose, e uma dispersão coloidal constituída pelas proteínas e uma emulsão envolvendo a gordura. Os demais componentes menores, tais como vitaminas e alguns radicais encontram-se dissolvidos no meio aquoso ou em algum dos seus componentes principais.
De uma forma geral, a composição básica do leite é a mesma, seja qual for a sua origem, mas a porcentagem de cada um dos componentes varia muito. Esta variação é mais marcante de uma espécie de animal para outra, em função da maior ou menor necessidade nutritiva do recém-nascido, que leva cerca de 6 meses para duplicar o seu peso inicial.
A variação da composição do leite entre as várias espécies de mamíferos é a mais acentuada, mas variações em menor escala ocorrem entre raças e até mesmo entre indivíduos de uma mesma raça; podem ainda variar com o estado de saúde, com a idade, com o tipo e qualidade da alimentação, com o período de lactação, com a ordenha, etc.
Sob o ponto de vista de exploração comercial, as raças de bovinos são as de maior interesse e o leite produzido pelas diversas raças apresenta uma variação bastante grande, principalmente com relação ao teor de gordura. Considerando-se que há uma grande variação no tipo de gado para exploração leiteira no Brasil, sendo encontradas diferentes raças puras e uma grande gama de cruzamentos diversos, podemos avaliar a grande variação que pode ser encontrada de uma região para outra e, até mesmo, de uma fazenda para outra.

Colostro

Além da variação normal na composição do leite de um animal para outro e das alterações que podem ocorrer devido às várias causas já mencionadas, como por exemplo a mamite, que é a mais comum, temos o leite denominado colostro.
O leite colostro é a secreção das glândulas mamárias nos primeiros dias após o parto, que apresenta composição, cheiro, sabor e aparência bastante diferentes do leite normal. Esta diferenciação é máxima nas primeiras horas e praticamente desaparece no quinto dia.
A composição do colostro varia rapidamente nas primeiras 24 horas, sendo que a maior variação ocorre por conta das globulinas, apresentando uma alta porcentagem de imunoglobulinas provenientes do sangue, visando dar imunidade ao recém-nascido. Após 2 a 3 dias, o colostro já apresenta uma composição bastante próxima à do leite normal. Entretanto, para fins de exploração comercial, somente após o quinto dia o leite é considerado normal; isto porque a diferença de constituição do colostro pode trazer problemas tecnológicos, relacionados com a instabilidade protéica face ao tratamento térmico durante a pasteurização, por exemplo.

Leite de retenção

Ainda devido ao efeito do parto, temos o leite de retenção, que é o leite nas últimas 2 a 5 semanas imediatamente antes do parto, o qual apresenta um sabor salino devido ao aumento do teor de sais e ligeira diminuição na lactose, principalmente. Assim como o colostro, o leite de retenção também não deve ser aproveitado para alimentação humana.

Efeito da alimentação na composição do leite

Um animal sadio e bem alimentado não apresenta variações sensíveis na composição do seu leite, em função de variações normais na alimentação ingerida. Entretanto, qualquer excesso,. principalmente por períodos longos, pode causar alterações relativamente grandes em um ou mais componentes do leite. A gordura é o componente que mais varia, tanto em quantidade como em constituição, podendo por exemplo, variar a sua consistência com a variação no tipo e na quantidade de ácidos graxos presentes na alimentação.
Mais do que a composição, a alimentação deficiente afeta a produtividade do animal, causando um grande decréscimo na quantidade de leite secretada. Por outro lado, contaminantes tóxicos ou nocivos como micotoxinas, pesticidas, elementos radiativos, etc. podem ser ingeridos com a alimentação e vir a ser excretado no leite, constituindo-se num problema de saúde pública muito mais sério do que a simples alteração composicional do leite.


Qualidade microbiológica do leite

Por ser o alimento natural mais completo, rico em princípios nutritivos em estado facilmente assimilável, o leite constitui-se um ótimo alimento não só para o homem, mas também é um excelente meio de cultura para a maioria dos microrganismos comumente encontrados na natureza.
Nas glândulas mamárias de animais sadios, o leite é praticamente estéril. Todavia, sua contaminação começa a ocorrer já nos próprios canais lactíferos e vai aumentando gradativamente, à medida que o leite segue o seu trajeto até o exterior do animal através das tetas. Em condições normais, essa contaminação é pequena, atingindo no máximo 10.000 germes / ml, sendo cerca de 1000 o valor médio. Essa pequena contaminação que já sai no leite recém-ordenhado é normalmente constituída de microrganismos saprófitos do animal, os quais não se multiplicam bem no leite e por conseguinte são menos importantes sob o ponto de vista tecnológico. Há, entretanto a possibilidade do leite recém-ordenhado já conter um número elevado de contaminantes e isto é geralmente, associado aos casos de infecções do úbere ou mamite.
Sob o ponto de vista tecnológico, os microrganismos contaminantes mais importantes são aqueles que atingem o leite após a ordenha e provêm principalmente dos utensílios e equipamentos utilizados na ordenha e no manuseio do leite da fazenda à plataforma de recepção da indústria de laticínios; podem, também, provir do meio ambiente com poeira, insetos, etc. Nesse caso, a contaminação é extremamente variável, tanto qualitativa como quantitativamente, dependendo das condições de higiene do ambiente , dos hábitos higiênicos do ordenhador, condições de limpeza dos utensílios e equipamentos e até mesmo das condições climáticas da região.
A qualidade do leite cru está intimamente relacionada com o grau de contaminação inicial e com a temperatura e tempo em que o leite permanece da ordenha até a pasteurização. Em geral, quanto maior o número de contaminantes e quanto mais próximo de 30ºC for a temperatura do leite, menor será o seu tempo de conservação. Deficiências higiênicas, tanto no manuseio como na limpeza dos utensílios e equipamentos, temperatura ambiente elevada e deficiências no emprego de refrigeração adequada para a conservação do leite desde a ordenha, constituem-se nos principais fatores responsáveis pela alta contagem microbiana no leite ao chegar à plataforma da indústria.
Ao cair no leite, os microrganismos contaminantes começam a se multiplicar e vão, gradativamente decompondo um ou mais componentes do leite, causando alterações de sabor, do aspecto físico, etc., chegando ao ponto de torná-lo inaproveitável ao consumo humano. Em condições favoráveis o número desses contaminantes pode atingir vários milhões e até bilhões de células por ml. Durante essa multiplicação ocorre uma seleção natural daqueles microrganismos que melhor se desenvolvem no leite. Normalmente há predominância das espécies do grupo lático, que atacam a lactose com a produção de ácido lático causando a fermentação mais comum do leite, resultando na sua acidificação. Muito antes da ciência ser capaz de explicar o fenômeno da acidificação do leite, a tecnologia empírica já tirava partido dessa transformação, visando aproveitar o valor alimentício do leite, transformando-o em produtos derivados, tais como coalhada, iogurte, queijos, etc. Além da acidificação, os microrganismos produzem vários outros metabólitos que são responsáveis pelo refinamento do aroma e sabor de tais derivados do leite. A acidificação é o principal agente de conservação, tornando o meio inadequado à multiplicação da maioria dos microrganismos, inclusive dos próprios agentes de fermentação que paralisam o seu crescimento quando o leite atinge um determinado grau de acidez.
Em termos práticos, pode-se dizer que não há alterações sensíveis no número de microrganismos contaminantes do leite dentro das duas primeiras horas após a ordenha, mesmo sem o emprego de refrigeração. Entretanto, após esse período, o aumento poderá ser extremamente rápido. Algum retardamento na velocidade de multiplicação dos contaminantes pode ser verificado ao se abaixar a temperatura do leite para 15 a 20ºC, o que pode ser conseguido em algumas regiões do Brasil, utilizando-se água corrente para esfriá-lo. Entretanto, um efeito significativo da refrigeração só se faz notar quando a temperatura do leite é mantida abaixo de 10 ºC, sendo que um controle adequado somente é possível na faixa de 0 a 4 ºC. Nesta faixa, o leite mantém a sua qualidade microbiológica por um período de até 72 horas entre a ordenha e o beneficiamento. É extremamente importante lembrar que a refrigeração cumpre o papel de diminuir a velocidade de multiplicação da maioria dos microrganismos comumente encontrados no leite; todavia não os destrói e muito menos paralisa a ação de suas enzimas; desta forma, é condição indispensável que o nível de contaminação inicial seja mantido o mais baixo possível.
Fonte: Behmer, M.L.A. Tecnologia do Leite. 5ª ed.Nobel, São Paulo - SP.

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